Acordou cedo, foi na padaria, fez café, fez o dejejum, tomou banho, beijou a mulher e saiu. Na metade da quadra percebeu um pneu furado. Mas havia tempo. Abriu o porta-malas, armou o triângulo, posicionou o macaco e cadê o estepe? Não estava lá. Coçou a cabeça... Não, não era momento de conjecturar sobre o acontecido. Resolveu arriscar! Foi em marcha lenta até a borracharia. "Tem jeito mais não! O senhor empenou o aro, agora só na retifica... Maldita liga leve."
O tempo ainda estava bom, só precisava agir com pressa. Deixou o carro ali mesmo. Pegou a pasta e alguns outros itens e partiu para a estação de metrô. Passou o cartão pra pagar os tickets: "Cartão vencido". Vencera no dia anterior... No bolso nenhum vintém... Voou para pegar algum dinheiro em casa mas deu com a cara na porta trancada: a mulher já tinha saído e sua chave estava no carro, na borracharia.
Agora o tempo já não era tão bom. Correu até a borracharia, apanhou a chave. Foi quando começou uma chuvinha fina. Apanhou o dinheiro e aí a chuva já era grossa. Por sorte tinha um guarda-chuva "zerado" que comprara de um ambulante. Saiu correndo até o ponto de táxi (era o único jeito, agora). Nem andou duas quadras um acidente bloqueava a avenida. Pagou o táxi e cruzou o tumulto a pé, sob forte chuva. Quando se aproximava de um outro táxi um ônibus passou em alta velocidade sobre uma poça de lama. Banho total. Não poderia ser... tudo estava conspirando.
Agora tempo estava no vermelho. Mas ele era persistente. Tomou outro táxi, foi em casa, se limpou, trocou de roupa e seguiu determinado para aquilo que ele considerava sagrado: seu trabalho. No caminho ia ensaiando o que dizer : "Chefe, o sr. não vai acreditar... acordei cedo... fui a padaria...". Não, não precisava dizer isso. Talvez apenas "Chefe desculpa o atraso é que aconteceram muitas coisas hoje pela manhã..." e ai poderia continuar. E se o chefe não acreditasse? Que fazer? Iria ser assim, "a verdade cabe em qualquer lugar"... Leu em algum lugar, ou sabe-se lá, acabara de inventar.
Duas horas de atraso e ele na frente do chefe: "Chefe, bom dia!". "Seria bom dia mesmo, seu Juca, se o senhor tivesse chegado no horário. Que aconteceu?" foi a resposta. Coçou o queixo, o nariz, a orelha e a testa e respondeu... "Tomei umas e outras ontem e acordei numa ressaca...". Contra todas suas expectativas o patrão abriu um sorriso: "Tá bom seu Juca! tem problema não. O senhor é dos meus! Falando a verdade assim vai longe. Ainda bem que o senhor não veio com historia de pneu furado, ônibus lotado... Ainda bem!"
Ilustração:
Imagem gerada por IA (ChatGPT), prompt do autor, 2024
Revisão ortográfica:
Reedições:
20/01/2021 - Correções de digitação
18/10/2024 - Formatação avançada e Ilustração.
19/10/2024 - Revisão ortográfica.