Uma certeza à mineira
Chicão era eletricista da prestadora regional, sediada em Manaus, que servia à nossa empresa. Mas não era "um", era "o" eletricista. Apesar de não ter formação superior (apenas técnica) e, talvez até por isso, não ter cargo administrativo em sua empresa, agia com total liberdade e muitas vezes tomava decisões de chefe que raramente eram contestadas pela "alta cúpula". Dizer que o cara era um bom eletricista é chover no molhado. Ele sabia tudo, desvendava qualquer enigma, resolvia qualquer parada.
Não havia naquele homem negro de quase 1,80 m de altura qualquer vestígio de ganância, orgulho ou esperteza. Era simples de origem e de vivência. Mineiro de Montes Claros, cidadezinha a quase 500 Km ao norte de Belo Horizonte, fora adotado ainda bebê por pais espanhóis que lhe deram educação carinho e principalmente cidadania. Era o cara que todo mundo gostaria de tê-lo como pelo menos conhecido, senão amigo. Apesar disso, sua desenvoltura dentro da empresa o prendia a rotinas muitas vezes antipatizantes. Atender toda a Região Norte como o "homem chave da elétrica" tinham lhe conferido um status de elite. Isso significava que suas preciosas horas, que nem eram tão mais caras que a de seus parceiros mas muito mais valiosas, só eram consumidas em serviços "sem solução". Para nós os "usuários" de seus serviços era muito comum trocar o "Solicitamos assitencia técnica para..." por "Solicitamos a presença do Sr. Francisco Gonzalez para..." Ao que parece essa tática foi sendo adotada por todos os "usuários" o que deixou o atendimento especial um pouco complicado. Vinham algum técnico primeiro e caso não encontrasse a solução ai, sim, vinha o Chicão. Feito esse aposto, entremos no "miolo" da questão.
Pois bem, certa ocasião, atendendo nosso pedido e não apenas o nosso, mas também de cidades do interior do estado, chegou cedo na nossa agência fez algumas "coisinhas", almoçou na minha casa, como era de costume, e foi-se. A tarde, ao saber de sua ida, meu chefe imediato me inqueriu: "Como é que você vai buscar o homem no aeroporto depois leva pra amoçar na sua casa e em seguida deixa ele ir embora?" "Calma chefe, amanha cedo ele vai estar aqui e só volta pra Manaus à noite.", contemporizei. "Que certeza você tem disso?", quis saber mais. "Certeza material. A garantia de que ele volta está na minha geladeira." "Uma CACHAÇA?". "Não chefe, um queijo mineiro que ele pediu pra eu guardar, pois vai levar pra comer com a esposa".
Meu chefe, coçou a barba lentamente com um olhar perdido no além, suspirou copiosamente. Depois, aprimorou seu sotaque e como um bom mineiro que também é, sussurrou com uma entonação de satisfação entremeada de vingança, como se visualizasse a cena:
- Volta! Ah se volta!
PS. Preciso dessa ultima fala (Volta, ah se volta) traduzida para um bom 'mineireis'. alguem se arrisca
Chico Chagoso
Enviado por Chico Chagoso em 21/10/2015
Alterado em 15/11/2015